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Rio de Janeiro em chamas: confronto entre polícia e facções transforma "Cidade Maravilhosa" num banho de sangue

Cidade entra em estado de alerta após operação contra o crime

28/10/2025

O som dos tiros ecoava pela Radial Oeste, em frente à favela da Mangueira, quando um grupo de jovens mascarados – fuzis em punho – parou um ônibus e o atravessou na pista. Passageiros se jogaram no chão, motoristas deram marcha à ré. A cidade, mais uma vez, mergulhava no caos.

Nesta terça-feira (28), o Rio de Janeiro entrou em estágio dois de atenção, o segundo nível mais alto de alerta urbano, após uma grande operação policial contra facções criminosas nos complexos da Penha e do Alemão. A ofensiva resultou em pelo menos 64 mortes, sendo quatro agentes – dois policiais civis e dois militares –, dezenas de feridos e uma onda de retaliações simultâneas em vários bairros.

As barricadas erguidas por criminosos interromperam o trânsito em vias centrais, ônibus foram incendiados, escolas suspenderam aulas e o metrô interrompeu parte do serviço. Em poucos minutos, a sensação de paralisia se espalhou por toda a cidade.

“O Rio de Janeiro não produz essas armas, não produz essas drogas, não produz esse poder bélico”, declarou o governador Cláudio Castro, em tom de exaustão, diante das câmeras. “Esse poder bélico está entrando pelas fronteiras, financiado via lavagem de dinheiro. Isso aqui não é uma briga política. É um clamor por ajuda.”

A fala de Castro, um aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, ecoou como acusação e súplica ao mesmo tempo. Ela também acentuou a tensão com o governo federal, que, em nota, respondeu que a segurança pública “é de competência estadual”.

No final da tarde, o governador corrigiu uma fala anterior, em que cobrava apoio federal. Após o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, declarar que não recebeu pedido de ajuda, e que a União só pode intervir se for decretado Garantia da Lei e da Ordem (GLO),  o governador obrigou-se a voltar atrás e assumir suas responsabilidades. 

Ao final, atendendo pedido do governo do Rio de Janeiro, o Ministério da Justiça transferiu para prisões de segurança máxima federais 10 criminosos identificados como líderes de facções criminosas.

Uma cidade sitiada

Às 16h, equipes de reportagens seguiam em direção à Cidade da Polícia quando os disparos começaram. O trânsito travou. Carros começaram a recuar em pânico. A cena – repetida em dezenas de pontos do Rio – era a de uma cidade refém de seu próprio território.

Segundo o Centro de Operações da Prefeitura, mais de vinte vias foram bloqueadas ao mesmo tempo. O órgão mantinha contato com a Defesa Civil e a Secretaria de Transportes para redirecionar linhas e atender ocorrências emergenciais. O nível de atenção, decretado no início da tarde, reflete uma situação em que múltiplos incidentes afetam a mobilidade e a segurança urbana de forma simultânea.

Em meio a tiros, a busca de alvos políticos

Nos bastidores, a declaração do governador acendeu um novo capítulo da disputa entre o Palácio Guanabara e o Planalto. Integrantes do governo federal viram na fala de Castro uma tentativa de deslocar responsabilidades num momento em que o Rio enfrenta uma crise de governabilidade nas favelas dominadas por facções.

Fontes do Ministério da Justiça, por outro lado, reconheceram que o controle das fronteiras e o tráfico internacional de armas e drogas são problemas de escala nacional, dependentes de políticas de integração que ainda não saíram do papel.

“O que acontece no Rio é o retrato mais visível de um problema brasileiro – a erosão do monopólio da força do Estado”, avalia um ex-secretário de Segurança.

Repercussão internacional

A escalada de violência ganhou destaque imediato na imprensa internacional.
A Reuters descreveu o episódio como “um dia de guerra nas ruas do Rio”. O Le Monde ressaltou “a militarização crescente da segurança pública brasileira”. Já o New York Times (edição internacional) destacou o contraste entre as promessas de pacificação feitas há mais de uma década e o atual retorno à lógica da guerra.

A Human Rights Watch e a Anistia Internacional pediram investigação independente sobre as mortes, alertando para o risco de execuções extrajudiciais durante operações em áreas densamente povoadas.

Repercussão internacional

Na Mangueira, moradores filmavam pelas janelas o ônibus atravessado na pista. Em Manguinhos, mães se encolhiam atrás de muros enquanto tentavam buscar os filhos nas escolas. No Complexo do Alemão, o comércio fechava as portas mais cedo – um gesto instintivo, quase automático, de quem aprendeu a sobreviver entre as rajadas.

“Eu já nem conto mais quantas vezes aconteceu isso este ano”, disse uma moradora a repórteres. “A gente só aprende a se proteger – mas nunca a se acostumar.”

Enquanto a noite caía sobre a cidade, os helicópteros ainda sobrevoavam o céu. O Centro de Operações recomendava que a população evitasse sair de casa. E o Rio, outra vez, parecia suspenso entre o medo e a resistência – uma metrópole que há décadas ensaia o mesmo confronto, com diferentes atores e o mesmo desfecho.

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