STF condena sete réus do "Núcleo 4" da tentativa de golpe; militares e policial federal pegam até 17 anos de prisão
Por quatro votos a um, Primeira Turma responsabiliza grupo por ataques ao Estado Democrático de Direito, disseminação de desinformação eleitoral e articulação de golpe. Ministro Fux diverge, gera crise interna e pede para permanecer nos julgamentos
21/10/2025
Julgamento do "Núcleo 4": debates acirrados sobre o conceito de golpe de estadoEm mais um desdobramento decisivo das investigações sobre a tentativa de golpe de Estado no Brasil, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta terça-feira (21) sete réus ligados ao chamado "Núcleo 4", grupo apontado como responsável pela disseminação coordenada de desinformação e incitação à ruptura institucional durante o processo eleitoral de 2022.
Com uma maioria de 4 votos a 1, os ministros Alexandre de Moraes (relator), Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Flávio Dino acompanharam a tese da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que o grupo atuou de forma organizada, armada e com objetivo claro de desacreditar o processo eleitoral, desestabilizar instituições democráticas e viabilizar uma tentativa de golpe de Estado no governo do então presidente Jair Bolsonaro.
Fux, o único voto discordante: "Participação dos réus não teve peso para provocar um golpe de estado"
O único voto divergente foi do ministro Luiz Fux, que contestou o enquadramento jurídico dos crimes. Para ele, as ações dos réus “não tinham potencial de conquista de poder e de substituição do governo”, o que excluiria o crime de tentativa de golpe.
O grupo condenado é formado majoritariamente por militares da reserva das Forças Armadas e um agente da Polícia Federal. As penas variam de 7 anos e seis meses a 17 anos de prisão:
- Ângelo Martins Denicoli (major da reserva do Exército): 17 anos em regime fechado.
- Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército): 15 anos e seis meses.
- Marcelo Araújo Bormevet (policial federal): 14 anos e seis meses.
- Giancarlo Gomes Rodrigues (subtenente do Exército): 14 anos.
- Ailton Gonçalves Moraes Barros (major da reserva do Exército): 13 anos.
- Guilherme Marques de Almeida (tenente-coronel do Exército): 13 anos e seis meses.
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, ex-presidente do Instituto Voto Legal: 7 anos e seis meses, em regime semiaberto.
Moretzsohn foi condenado por apenas dois dos crimes: organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Os demais réus também respondem por golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e grave ameaça, além da formação de organização criminosa.
As penas ainda não resultam em prisão imediata: os réus poderão recorrer em liberdade. No entanto, todos eles foram declarados inelegíveis por oito anos após o cumprimento da pena.
Maioria do STF julgou que os réus propagaram "teorias conspiratórias" com o objetivo de desestabilizar a democracia e provocar quebra institucional
Desinformação como arma
Segundo a acusação da PGR, os réus teriam participado de uma estrutura coordenada de desinformação digital com o propósito de minar a credibilidade das urnas eletrônicas, propagar teorias conspiratórias sobre fraude eleitoral e incitar a população à ruptura institucional. Parte do conteúdo teria sido distribuído em redes sociais, aplicativos de mensagens e por meio de entidades como o Instituto Voto Legal, sob a liderança de Moretzsohn.
Durante os protestos que culminaram na invasão e depredação dos prédios dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023, membros do Núcleo 4 teriam agido para fomentar os atos violentos, motivados por uma suposta “intervenção militar constitucional”.
Por conta dos danos materiais causados na ocasião, os sete réus foram condenados, de forma solidária, ao pagamento de R$ 30 milhões – montante que será dividido com outros condenados envolvidos nos mesmos ataques.
Implicações militares
Os militares condenados ainda poderão ser submetidos a julgamento no Superior Tribunal Militar (STM), em ações autônomas para a eventual perda do oficialato. A jurisprudência atual permite que condenações civis sejam utilizadas como fundamento para exclusão da carreira militar em casos de atentado contra a Constituição.
O Ministério da Defesa ainda não se manifestou oficialmente sobre as condenações. O Exército Brasileiro afirmou que só se pronunciará após o trânsito em julgado das sentenças.
Rachaduras internas no STF
A condenação também evidenciou tensões dentro do Supremo Tribunal Federal. Após divergir do entendimento da maioria, o ministro Luiz Fux solicitou, ainda durante a sessão, sua transferência da Primeira para a Segunda Turma, mas pediu para continuar participando dos julgamentos dos próximos núcleos da trama golpista.
O pedido gerou controvérsia. O presidente da Primeira Turma, Flávio Dino, respondeu que consultará o presidente da Corte, Edson Fachin, sobre a possibilidade de Fux permanecer excepcionalmente nos casos pendentes, mesmo após a migração para outro colegiado. O regimento interno do STF é omisso sobre a situação, o que abre espaço para disputas administrativas.
A movimentação de Fux ocorre num momento em que a Primeira Turma está reduzida a apenas quatro ministros, após a aposentadoria de Luís Roberto Barroso. A cadeira vaga ainda aguarda indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O que vem pela frente
A condenação do Núcleo 4 eleva para 15 o número de réus já penalizados pelo STF no contexto da tentativa de golpe de 2022–2023. Os oito primeiros, ligados ao Núcleo 1 e liderados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, foram condenados em setembro.
Os julgamentos continuam com os demais núcleos:
- Núcleo 3 – julgamento previsto para 11 de novembro.
- Núcleo 2 – a partir de 9 de dezembro.
- Núcleo 5 – sem data definida. Este último é composto por membros do setor empresarial, incluindo o ex-comentarista e empresário Paulo Figueiredo, neto do último presidente do regime militar, que reside nos Estados Unidos e não apresentou defesa.
Com dezenas de réus ainda a serem julgados, o STF mantém o caso como uma prioridade institucional. A Corte tem sinalizado que tratará todas as frentes da trama golpista com severidade, celeridade e transparência, buscando não apenas responsabilizar os culpados, mas também reafirmar os limites constitucionais do poder político e militar no Brasil democrático do século XXI.
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