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Desembargador do Paraná recebe processo disciplinar por décadas de assédio sexual e moral

Relatório aponta uma sucessão de atos irregulares cometidos por Luís César de Paula Espíndola

14/10/2025
Um dos comentários feitos em público pelo desembargador, sobre as mulheres: “Elas andam com cachorrinhos e estão loucas atrás de homensUm dos comentários feitos em público pelo desembargador, sobre as mulheres: “Elas andam com cachorrinhos e estão loucas atrás de homens"

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou por unanimidade, nesta terça-feira (14), a abertura de um processo administrativo disciplinar contra o desembargador Luís César de Paula Espíndola, acusado de múltiplos episódios de assédio moral e sexual cometidos desde a década de 1980 contra servidoras do Tribunal de Justiça do Paraná.

Durante a 13ª Sessão Ordinária do órgão, os conselheiros também decidiram manter o afastamento cautelar do magistrado, considerando que sua conduta fere os princípios básicos do exercício da magistratura.

O processo disciplinar – registrado sob o número 0003915-47.2024.2.00.0000 – teve como base depoimentos de servidoras colhidos durante uma inspeção da Corregedoria Nacional de Justiça no tribunal paranaense.

As vítimas relataram episódios recorrentes de assédio e intimidação por parte do desembargador, inclusive em contexto de subordinação hierárquica.

Um dos incidentes mais recentes citados ocorreu em sessão da 12ª Câmara Cível, quando Espíndola, ao julgar a manutenção de medida protetiva a uma menina de 12 anos vítima de abuso por um professor, proferiu declarações minimizando a violência e culpabilizando a vítima. Foi o único voto divergente no caso.

“Hoje em dia, os homens é que estão sendo assediados pelas mulheres”, afirmou. “Elas andam com cachorrinhos e estão loucas atrás de homens" – disse ele, durante a pronuncia do seu voto.

Padrão de abuso e omissão institucional

As investigações apontam que os episódios de má conduta não se limitaram ao ambiente forense. De acordo com o advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira, representante da Ordem dos Advogados do Brasil, o desembargador utilizava funcionárias do gabinete como empregadas domésticas e cuidadoras de sua mãe. Segundo relatos, as servidoras criaram “protocolos de sobrevivência” para evitar ficarem sozinhas com o magistrado.

Espíndola também foi condenado, em 2014, por violência doméstica contra a própria irmã – desembargadora no mesmo tribunal – em uma ação penal registrada no Distrito Federal. Ainda assim, continuou exercendo a magistratura por mais de uma década após a sentença.

O corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, criticou a leniência histórica com desvios de conduta no Judiciário. “A permanência de casos prescritos e a ausência de responsabilização efetiva revelam uma falha estrutural que precisa ser enfrentada com firmeza”, afirmou. “A prioridade deve ser prevenir novas vitimizações.”

Transparência e compromisso ético

Durante a sessão, o presidente do CNJ, ministro Edson Fachin, defendeu que a responsabilização de agentes públicos é fundamental para a integridade institucional. “Juízes erram e devem ser responsabilizados. Legisladores erram, e também devem responder por seus atos. As instituições só se sustentam com transparência e responsabilidade”, disse.

A conselheira Renata Gil, que preside o Comitê de Combate ao Assédio no CNJ, criticou a falta de ação do tribunal paranaense ao longo dos anos. Segundo ela, o caso demonstra a urgência de estruturas internas eficazes, fiscalizadas de perto pelo próprio CNJ. “Salta aos olhos o tempo em que esses atos foram praticados sem qualquer resposta institucional adequada”, declarou.

Gil afirmou que o CNJ acompanhará os desdobramentos do processo, assim como a implementação de julgamentos com perspectiva de gênero nos tribunais. “Esse episódio reforça a importância da formação ética e da vigilância institucional contínua.”

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